‘Não há a menor possibilidade de afastamento de Pimentel’

3 de maio de 2016
Foto: O Tempo

Defensor de Fernando Pimentel na operação Acrônimo, Pacelli diz que não há possibilidade de o governador deixar o cargo por ser investigado

Publicado em O Tempo por Fransciny Alves

O advogado do governador Fernando Pimentel, Eugênio Pacelli, diz que não há qualquer possibilidade de o deixar o cargo por ser investigado no âmbito da operação Acrônimo. O advogado ainda considera um “equívoco” o indiciamento de Pimentel pela Polícia Federal, e acredita que a denúncia não será acolhida pela Procuradoria Geral da República.

LEGENDA: OT = O Tempo // EP = Eugênio Pacelli, advogado do governador

OT – Como o senhor analisa as acusações que pesam sobre o governador Fernando Pimentel no âmbito da operação Acrônimo?
EP – A Acrônimo, ela tem um objeto específico, ela começou com um objeto específico, a partir de uma apreensão de uma aeronave. Todo mundo conhece essa história. Nós temos vários reparos sérios, significativos, relevantes em relação a essa apreensão. São questões técnicas, mas nós vamos demostrar, estamos levando ao conhecimento do Superior Tribunal de Justiça, uma questão de ordem para demonstrar que, segundo nos parece, tudo isso foi uma questão orquestrada. A notícia da existência da aeronave, que não está bem explicada quem deu a notícia, como foi esse meio dessa notícia, tudo isso indica que houve uma preparação de uma situação de fato. Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto em relação a defesa do governador, é que ele está absolutamente tranquilo, por quê? Porque até agora o que vimos como motivos de indiciamento, não chegam a ele de maneira alguma. São interpretações, ilações, absolutamente indevidas feitas pela a autoridade policial. Então, assim, é claro que no inquérito quem preside é a polícia. E é claro também que ele tem a liberdade para entender as coisas como lhe parecem de direito. Do lado de cá, nós percebemos que há um erro muito grande na inclusão do governador nessa história. Porque, o que se pretende extrair é que, uma relação de amizade existente entre o governador e outras pessoas teriam também a consequência de ser criminalizado pelo fato que se imputa a outro. Então, nós estamos absolutamente tranquilos quanto ao conteúdo da acusação.

OT – E são quantos inquéritos no âmbito da Acrônimo?
EP – Na verdade não. A Acrônimo é um inquérito, mas que houve agora algumas ramificações a partir do depoimento prestado por uma das pessoas. Essa pessoa parece que prestou uma colaboração premiada, e ela se referiu a campanha de 2010. Essa campanha de 2010 não afeta o governador do Estado. Ela diz respeito às eleições para presidente. E essa informação dessa pessoa gerou um desdobramento que tem que ir para o Supremo, que é o competente para apreciar atos do presidente da República. O outro inquérito que parece que está havendo um desdobramento diz respeito a outras questões, me parece – eu não tenho conhecimento pleno, mas eu tive informações que haveria esse desdobramento para investigar um problema associado a campanha eleitoral do governo de 2014. Mas nada que vê com a ilicitude da Acrônimo. Seria questionamentos sobre documentações da campanha eleitoral. São informações que eu obtive, eu não posso dizer que se trata disso.

OT – E há suspeita de que teria orquestrado essa suposta ação contra o governador Fernando Pimentel?
EP – Não. Eu não posso emitir um juízo desse sentido, ou dessa natureza, porque veja bem: o fato da abordagem foi feito no dia 7 de outubro. Quando é que foi a eleição nossa? Dois dias antes. Então, estava ainda em plena comemoração do resultado. Aí vem uma denúncia dessa, e o que você descobre nessa diligência? Que havia documentos relativos a campanha do Pimentel. Então é claro que alguém sabedor desse fato, dessa viagem, é que fez essa denúncia, provavelmente anônima, a gente não viu ainda nada oficial, com o objetivo claro de criar um fato, ou um factoide, pra ser objeto de impugnação na Justiça Eleitoral.

“O que vimos como motivos não chega a ele de maneira alguma”

OT – Qual a relação do governador com o Benedito Rodrigues Neto de Oliveira, o Bené?
EP – Eu não posso dizer. Essa pergunta é muito pessoal, essa pergunta deve ser feita a ele. O que eu posso dizer, com o conhecimento que eu tenho dos autos, que é o mesmo que a autoridade policial tem, é que tudo indica que eles tenham uma relação de proximidade, ao nível da amizade. Acho que, os autos demostram que Benedito atuou também na campanha de 2014, mas atuou em várias campanhas de vários candidatos, essa não é uma exclusividade do governador.

OT – A Polícia Federal indiciou o governador no início de abril por corrupção passiva, organização criminosa, lavagem de dinheiro e tráfico de influência. Havia necessidade desse indiciamento?
EP – Porque o governador não compareceu ao depoimento? Muito simples de explicar e difícil entender porque é que não foi compreendido a situação toda, que era juridicamente fácil. Em primeiro lugar, ele não compareceu porque existe uma súmula no Supremo, súmula vinculante, que obriga a todos, que garante a defesa de qualquer investigado conhecer todo o material investigativo antes de se depor. Então, nós fomos tendo surpresas ao longo dos tempos, da existência de uma material investigativo que não estava juntado ainda aos autos do inquérito. A cada momento que você ia lá para atualizar o inquérito, apareciam peças que eram do passado, mas não tinham sido juntadas. Então, eu não posso levar alguém… Ele (Pimentel) queria depor, na nossa petição, nós encaminhamos uma petição para a delegada dizendo que ele queria depor, mas o meu aconselhamento técnico foi que de ele não depusesse, porque nós temos o direito de saber, de conhecer todo material informativo para dar os esclarecimentos que a gente precisa dar. Quando você não tem o conhecimento de tudo, não é o receio de você não conhecer um documento, e isso ser uma surpresa, não é isso, é que quando você desconhece um fato que a pessoa traz para você na hora, você não tem como trazer a resposta com claras de fato. Você precisa do tempo, mas você não vai ter tempo, você está sentado ali para prestar depoimento, aí você não tem como responder, porque você precisa buscar um documento para contrapor aquele de lá. Então, isso daí pode gerar uma expectativa ou pode gerar uma impressão que a defesa não soube responder. E não é verdade. Por isso que a gente precisa saber todo material.

OT – E agora, já se sabe de todo material?
EP – A gente espera que sim. Eu ainda acho que não. De todo modo, a delegada já fechou o interrogatório dele e já indiciou. E o que nós vamos fazer? Logo que esteja encerrado e o inquérito com o relatório policial pronto, nós vamos solicitar ao Ministério Público Federal para que ele seja ouvido junto à Procuradoria Geral da República. Você falou em corrupção… vamos explicar. Isso não faz o menor sentido. Isso não tem o menor sentido, o menor fundamento. Mas você pode dizer: não é possível que a autoridade policial tirou isso assim da cartola. Não é isso. O problema hoje no Brasil é que algumas realidades fáticas que sempre aconteceram no mundo da política, o pessoal agora começou a querer criminalizar esses comportamentos. Chega-se ao absurdo de querer dizer que é crime a publicação de uma lei. Por exemplo, existe na operação Zelotes, uma denúncia feita contra várias pessoas, dizendo que eles são culpados de terem obtido uma lei em favor de um grupo econômico. Tem cabimento alguém conseguir uma lei em favor de um grupo econômico? Então, quem deve ser processado é o Congresso Nacional, porque ninguém pode chegar e conseguir uma lei que é aprovada por 513 deputados, e depois passar no Senado da República. Então, essa atividade que é conhecida como lobby, sempre existiu, agora o Ministério Público na onda, talvez, na onda do que está acontecendo em Curitiba, acha que pode também criminalizar qualquer tipo de comportamento. E aí, dizer que alguém que baixa uma portaria, que defere, que regula uma atuação no mercado produtivo, e isso seria a favor de um determinado grupo econômico, é uma ignorância absurda. Porque na verdade, todos os atos no Ministério da Industria e Comércio, todos eles, todos as portarias regulativas e regulatórias, todos beneficiaram grupos inteiros do setor automobilismo. Então, é muita ingenuidade ou desconhecimento completo de causa, supor que uma relação de amizade é que tenha favorecido a publicação desse marco regulatório.no Ministério da Industria e Comércio, todos eles, todos as portarias regulativas e regulatórias, todos beneficiaram grupos inteiros do setor automobilismo. Então, é muita ingenuidade ou desconhecimento completo de causa, supor que uma relação de amizade é que tenha favorecido a publicação desse marco regulatório.

“O afastamento tem que ter aprovação de dois terços do Legislativo”

OT- Mas antes do indiciamento do governador pela Polícia Federal, o ministro Herman Benjamin, relator dos inquéritos da Acrônimo no Superior Tribunal de Justiça, já havia autorizado o indiciamento se todas as etapas da investigação fossem cumpridas pela PF…
EP – Isso precisa ser muito esclarecido. Na verdade, o ministro não deu autorização, não avalizou – porque a gente avalia o que conhece, o que o ministro disse é que estaria autorizado, se a delegada entendesse que seria uma hipótese de indiciamento. O ministro não desceu a detalhes sobre a eventual robusteza da prova, porque ele não pode fazer isso. Na fase de investigação, juiz não da palpite, nem ministro. O que o ministro faz na fase de investigação de processo de foro privativo é controlar a legalidade dos atos. Então, pode fazer isso? Pode. Pode fazer aquilo? Pode. Então, o ministro acha que pode indiciar, é só isso. Ele não está dizendo que deve ser indiciado porque o material probatório é forte. Ele não pode fazer isso. Ele não avalia o material probatório.

OT – Em janeiro deste ano, a Procuradoria Geral da República se manifestou contrariamente ao indiciamento do governador de Minas Gerais. O senhor acredita que isso irá repetir agora?
EP – Na verdade, a PGR, o Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, e a maioria dos membros que oficiam nos tribunais superiores são contra o indiciamento de autoridade por foro privativo, por quê? Porque não há previsão legal. Então, a gente não está trabalhando com essa lógica. O indiciamento foi uma coisa que foi feita equivocadamente, mas não vamos ficar discutindo isso, porque as consequências do indiciamento são meramente estigmatizantes. Então, a imprensa dá notícia indiciando ou não indiciando, entendeu? Então, a gente não está muito preocupado com isso. A gente acha que está errado, questionamos o indiciamento para mostrar que está errado, na linha do que entende o Ministério Público Federal. Agora, recentemente, o Rodrigo Janot lançou parecer em um inquérito policial envolvendo a deputada Gleisi (Hoffmann), exatamente dizendo tudo que eu disse. Dizendo que não é cabível o indiciamento por falta de previsão legal. A nossa posição agora não é essa, a nossa posição agora é nos dirigirmos ao Ministério Público Federal, já que a polícia já está convencida, nós vamos discutir agora com o Ministério Público Federal para demonstrar à sua excelência, procuradora Ela (Wiecko), que na verdade, primeiro, há várias irregularidades na investigação, e segundo que não há responsabilidade do governador do Pimentel.

OT – O artigo 92 da Constituição Mineira prevê que o Chefe do Executivo pode ser afastado das suas funções por crimes comuns, se recebida a denúncia ou a queixa pelo Superior Tribunal de Justiça. Ou seja, atualmente, o governador poderia ser afastado das suas funções como a oposição vem alegando?
EP – Vou começar fazendo quase uma brincadeira, que é uma troça. Há uma razão muito boa para que não haja um processo como esse. Para a gente não quer que experimentar um circo de horrores como foi aquele da votação de domingo (do impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados), em que as pessoas agradeciam até os cães e os gatos da casa pela votação. Mas, falando sério, não existe a menor possibilidade de existir o que estão falando, a menor possibilidade. A Constituição Federal, que é quem regula a matéria, ela diz que somente haverá o afastamento de quem exerce o cargo, por exemplo a presidente Dilma, se houver aprovação por dois terços do respectivo poder Legislativo. Então, no caso da presidente da República, o afastamento tem que ter aprovação de dois terços do Congresso Nacional, no caso do governador do Estado, para que se possa pensar no recebimento da denúncia, é preciso que a Assembleia também aprove por dois terços. Mas veja bem, antes da questão ser submetida a dois terços da Assembleia, é preciso que o Ministério Público ofereça a denúncia. Então, esse é o primeiro passo. Só depois de oferecida a denúncia, aprovada na Assembleia por dois terços, recebida a denúncia no tribunal, é que pode se dar o afastamento. Essa é a determinação da Constituição Federal, a Constituição Mineira não acolhe uma parte dessa disposição, mas isso não impede que seja aplicado. A Constituição do Estado de Minas, se reporta à Constituição Federal, e copiou vários dispositivos da regulação da matéria em relação ao presidente da República. Só que não colocou a aprovação da Assembleia em dois terços, aí o Supremo Tribunal Federal, o plenário do Supremo diz o seguinte: não tem o menor cabimento pensar-se na possibilidade de afastar o governador do Estado pelo fato do recebimento da denúncia, só pelo fato do recebimento da renúncia. Na verdade, a gente não poderia nem admitir que se afastasse quem quer que fosse por recebimento de denúncia. Você não é julgado, culpado, nem nada. Mas, a Constituição autoriza o afastamento desde que haja um julgamento político prévio. É este julgamento político prévio que faltou na Constituição Mineira, mas que o Supremo Tribunal Federal disse que independe de estar previsto. Exatamente pela consequência que é a mesma, atribuída ao presidente, também há de ser feito o mesmo requisito.

“O indiciamento foi uma coisa feita equivocadamente”

OT – Em caso de suposta condenação no STJ, o governador poderia ser afastado ou destituído do cargo, como prevê o inciso 18, do artigo 62 da Constituição Mineira, que diz que o governador e vice-governador podem ser destituídos após condenação por crime comum – que é o caso da Acrônimo, ou de responsabilidade?
EP – São coisas diferentes. Você falou de duas questões que as pessoas não entendem muito bem: crimes comuns e crimes de responsabilidade. O que está acontecendo no Supremo Tribunal Federal, em relação a presidente Dilma, é um processo de impeachment, que é crime de responsabilidade. Este procedimento é diferente, quando houver, mas se houver, uma ação penal contra a Dilma, o que vai acontecer: antes do recebimento da denúncia, o Congresso Nacional vai ter que aprovar por dois terços, e aí o Supremo Tribunal Federal poderá receber ou não a denúncia. No caso do governador é a mesma coisa. Tem a previsão para crime de responsabilidade e a previsão para crimes comuns. O que nós estamos discutindo na Acrônimo são crimes comuns, não tem a ver com o processo de impeachment. Processo de impeachment é semelhante ao que ocorre lá no Congresso Nacional em relação a presidente Dilma, mas nada tem que ver com recebimento de denúncia. Por exemplo, no processo de impeachment da Dilma, quem vai tocar o assunto, quem vai tocar o processo é o Senado. Coube a Câmara dos Deputados apenas aprovar, a partir de quando recebe no Senado afasta. Com o impeachment de governador o procedimento é o mesmo.

OT- Mas a possibilidade do Pimentel?
EP – Absolutamente zero. Não há procedimento de impeachment em curso. Primeiro, não há procedimento de impeachment em curso, segundo, não há nem ação penal proposta, denúncia oferecida e muito menos ainda qualquer cogitação de manifestação da Assembleia nesse sentido.

OT – O senhor gostaria de acrescentar mais alguma coisa?
EP – Eu gostaria de dizer. Na verdade, eu acho importante sim, porque o Brasil vive um momento muito tenso por variadas razões. Mas é preciso que as pessoas também recuperem um pouco a razão. Nós já vimos recentemente no Brasil, inocentes serem linchados, foram mortos. Teve uma mulher que foi morta recentemente no Brasil porque uma turma acho que ela era que tinha feito não sei o quê. Ela foi morta e depois descobriu-se que ela não tinha nada a ver com o assunto. Quem matou, deve está em casa chorando ou rezando. Mas, a gente tem que evitar que essas coisas aconteçam, e exatamente para isso existem leis e justiça. O poder Judiciário não pode ser refém deste tipo de pressão como está acontecendo no Brasil. Pressão que se torna quase uma caça às bruxas, onde todo mundo que exerce cargo público é responsável por algum tipo de falcatrua. Tem que parar com isso, tem que saber separar joio do trigo.

Fonte: O Tempo