Sem carro, criminoso é solto
Réus em processos de tráfico de drogas têm sido liberados porque não são levados para audiência
Matéria publicada no jornal O Tempo, por Aline Diniz, em 27/20/2017
Após a prisão de um traficante, a Justiça tem exatos 180 dias para realizar a audiência que vai definir o futuro do suspeito. Quando o detido não comparece ao fórum e esse prazo expira, ele é solto. Essa situação, que deveria ser exceção, está se tornando comum em Belo Horizonte há pelo menos dois meses. O motivo é a falta de veículos do Estado para transportar os detentos até o fórum.
“Na semana passada, eu coloquei quatro indivíduos acusados de tráfico em liberdade porque eles não puderam comparecer à audiência”, denunciou a juíza Andréa Cristina de Miranda Costa, titular da 2ª Vara de Tóxicos de Belo Horizonte, em entrevista à rádio Super Notícia 91,7 FM. A Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap) informou que está ciente do problema e que novos veículos já foram adquiridos.
Segundo a magistrada, a situação é especialmente grave porque não é possível remarcar audiências de instrução e julgamento de um dia para o outro. A agenda dos juízes, geralmente, já está comprometida por um longo período. “Tenho audiências marcadas para 2018”, detalhou Andréa. Por dia, a juíza realiza, em média, seis ou sete audiências. Por ano, são aproximadamente 800 sessões. “Há um mês, coloquei em liberdade um suspeito de tráfico preso com uma submetralhadora”, acrescentou.
Burocracia. Para que uma nova audiência ocorra é preciso seguir trâmites que envolvem, inclusive, uma nova intimação. A situação é ainda mais difícil quando o processo julga mais de um réu. “Eu já tive audiências com 35 réus, que eu demorei uma semana. Imagina se eles não aparecem no último dia? Meu trabalho seria perdido”, exemplificou a magistrada.
Para garantir que o trabalho da Polícia Civil, do Ministério Público e da Justiça não se perca, Andréa tem viabilizado, por conta própria, a presença dos presos no fórum. “Eu tenho conseguido, às vezes, fazer as audiências por meio do chefe da carceragem do fórum e do chefe de administração prisional. Ligo pessoalmente, e eles têm a melhor das intenções (para conseguir o transporte do detento). Mas isso deveria ser exceção”, conta.
O advogado e membro do Conselho Penitenciário do Estado de Minas Gerais Lázaro Guilherme pontua que o preso não pode ser prejudicado pela falta de estrutura do Estado. “Isso faz com que o preso precise ficar mais tempo aguardando o julgamento, e o processo atrasa”, disse.
A juíza Andrea Costa concorda com o advogado e ainda acrescenta outro problema social grave da soltura de presos nessas condições: “O prejuízo é a impunidade”.
Números
800 é a média anual de audiências feitas pela juíza
7 é a média diária de audiências da magistrada
Saiba mais
Números. A Secretaria de Estado de Sistema Prisional (Seap) informou que há cerca de 70 mil presos nas 210 unidades prisionais – 46,68% deles são provisórios. A média mensal de escoltas realizadas pela Seap no Estado é de 15 mil entre transportes para fóruns, hospitais e transferências de presos.
Resposta. A Seap informou que adquiriu em junho 33 veículos. Cada carro terá a capacidade de transportar oito detentos. A previsão é que comecem a circular na segunda quinzena de novembro. Outros 27 veículos adquiridos em junho já estão em operação.
Submetralhadora caseira é apreendida
Uma denúncia anônima levou policiais militares à casa de um traficante, no bairro Riacho, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. O morador conseguiu fugir, mas os militares encontraram na casa uma submetralhadora caseira e diversas porções de drogas.
Conforme a corporação, a denúncia chegou por volta das 2h de quinta-feira (26). Na casa foram apreendidas 122 buchas de maconha, meia barra de pasta-base de cocaína e 99 pinos de cocaína, além de material para embalar drogas.
Até o fechamento desta edição, o morador do imóvel não havia sido preso.
Também em Contagem, policiais militares conseguiram evitar um assalto no bairro Cidade Industrial. Dois homens em uma moto tentaram assaltar um homem em um ponto de ônibus, no início da madrugada, e fugiram quando perceberam um carro da PM. (Pedro Ferreira)
Minientrevista
Andréa Costa
Juíza da 2ª Vara de Tóxicos de BH
Quais são os prejuízos para a sociedade quando suspeitos são soltos? Existe o risco da fuga. Ele (suspeito) já sabe o que há de provas contra ele, já que ele sabe o que os policiais falaram na delegacia que vai ser repetido na audiência. Um criminoso em potencial pode voltar para as ruas. O trabalho da polícia terá sido em vão. Além disso, há todos os gastos públicos. O prejuízo é a impunidade. Essa situação tem que se regularizar, mas nos dois últimos meses se agravou.
Por que uma nova audiência não é marcada imediatamente? Não posso marcar para amanhã, por exemplo, porque minha pauta está completa de audiências. Eu preciso de um certo tempo para reorganizar, para que o oficial de Justiça possa intimar e para que eu possa requisitar todo mundo. Não consigo fazer isso em dois ou três dias e eu tenho outros presos nessa situação. O problema é gravíssimo. (AD)
Fonte: O Tempo
Posicionamento do Sindpol/MG
Esse absurdo demonstra a pouca inclinação que o Governo do Estado tem para com a temática da Segurança Pública, que é lamentável sob todos os aspectos. A situação também não é diferente para a Polícia Civil, onde nós temos carência de viaturas, falta de manutenção periódica da frota veicular, e a carência de efetivo.