Sindicato cidadão: programa mais Médicos alcança rincões de Minas Gerais e otimiza índice sociais, inclusive de segurança pública na contensão de conflitos.

Sindicato cidadão: programa mais Médicos alcança rincões de Minas Gerais e otimiza índice sociais, inclusive de segurança pública na contensão de conflitos.

 

Vale do Aço. “O problema não é a falta concreta, mas a ausência constante”. Com as sobrancelhas erguidas de espanto, a médica cubana Esperanza Sosa, 50, avalia a saúde em cinco pequenas cidades do Vale do Aço. Todas elas só tiveram médicos destinados à atenção básica por, no máximo, um ano. O período é considerado insuficiente para atuar no Programa Saúde da Família (PSF), segundo o Ministério da Saúde.
 

Há um mês, Esperanza atende pacientes carentes do distrito de Cachoeira do Vale, em Timóteo. Veio para modificar a rotatividade de médicos. Ela está entre os cinco cubanos que vão atender, por pelo menos três anos, moradores de Antônio Dias, Jaguaraçu, Marliéria, Timóteo e Pingo D’Água. A reportagem de O TEMPO percorreu essas cidades e acompanhou o início do trabalho dos profissionais no programa Mais Médicos.

Apesar dos municípios possuírem unidades de saúde estruturadas para atender a população, o entra e sai de médicos causa desconfiança. Em Antônio Dias, dos 9.500 moradores que vivem na cidade, apenas 20% têm o hábito de voltar mais de uma vez ao mesmo médico. “Muitos não acompanhavam doenças graves porque a cada seis meses era um médico diferente e os moradores se sentiam inseguros com isso. Nunca tivemos um mesmo médico por mais de um ano”, analisa Newton Castro, secretário de saúde de Antônio Dias.

Para mudar essa situação, a médica cubana Alina Antônia Ortega, 48, que trabalhou por seis anos com comunidades carentes da Venezuela, começou a conhecer principalmente os moradores da zona rural e chegou até a fazer curativos mesmo antes de iniciar os atendimentos.

“Na minha primeira semana, vim conhecer os moradores e vários deles me colocaram para dentro de casa. Cheguei a chorar emocionada com o carinho que nunca tive de pacientes. Fiz um curativo em um menino de 10 anos que se machucou jogando bola e aquilo foi demais para a comunidade. São pessoas simples e sossegadas, que são carentes de médicos”.

Perigos. Porém, por trás da vida sossegada do interior, os moradores enfrentam os riscos da diabetes e da hipertensão, responsáveis por 90% da demanda médica dessas cidades. Mesmo com uma infecção causada pela diabetes, o comerciante José Anjo de Ramos, 61, dono de um restaurante na cidade de Jaguaraçu, ficou seis meses sem ir ao médico. Ele só voltou a realizar consultas há duas semanas, após ser estimulado pelo cubano Leonardo Ledea Ernandes, 43, responsável pelo PSF que atende os 2.080 moradores do município.

“Ele almoçou aqui e insistiu para que eu fosse consultar porque a doença precisa ser acompanhada e eu não estava sentido efeito do remédio. Consultei e vou voltar porque, além de trocar meu remédio, ele pergunta tudo sobre o que a gente está sentindo com muita atenção”, disse o comerciante.

Urgências. Além de atender casos básicos de saúde, um médico cubano foi colocado à prova durante uma emergência. Na cidade de Pingo D’Água, o último dia 30 de outubro foi tumultuado no posto de saúde. Por volta das 17h40, uma paciente de 29 anos quase deu à luz dentro do carro enquanto percorria 20 km entre o distrito de Revés do Belém, em Bom Jesus do Galho, e o posto mais próximo de casa, em Pingo D’Água. Apesar de encontrar as portas da unidade de saúde parcialmente fechadas, ela teve a sorte de o médico Luís Enrique Cintra Gonzales, 47, estar no posto mesmo meia hora  após o fim do expediente.

“A mulher tinha problemas mentais, mas o parto foi tranquilo porque tenho experiência nisso, fiz vários em Cuba, Guiné Equatorial e na Venezuela, onde atuei. Demos sorte porque é meu hábito esperar um pouco depois da hora de ir embora, caso apareça alguém. Não me importo porque esse é o meu trabalho”, disse.

Carga horária
Mudança. Em 2011, o Ministério da Saúde permitiu que médicos do PSF fizessem 20h ou 30h semanais, ao invés de 40h. Porém, a intenção de atrair mais médicos com a medida nunca foi mensurada em estudo.


Mais sobre o PSF

– Estrutura. Em todas as cidades visitadas pela reportagem, há pelo menos um posto de saúde com estrutura para assistência básica, capaz de realizar consultas de atendimento à família, além da especialidade ginecológica.

-PSF. Além disso, todos possuem ao menos uma equipe do Programa Saúde da Família (PSF) com pelo menos um médico, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e de quatro a seis agentes comunitários de saúde (ACS) – segundo a recomendação prevista pelo Ministério da Saúde.

– Problema. Apesar disso, mesmo com a média de permanência de apenas um ano dos médicos mineiros no PSF, o Ministério da Saúde não prevê tempo mínimo de atuação do profissional em uma mesma localidade. A pasta apenas adverte que “é necessário rever o tempo de permanência de médicos que atuem apenas por um ano no programa”.

 

Entre o churrasco e as cachoeiras, cubano cogita ficar no Brasil

Em pouco mais de um mês em Minas Gerais, enquanto alguns médicos cubanos se ambientam com a língua portuguesa e o tempero mineiro, outros já se sentem praticamente em casa e cogitam até a possibilidade de permanecer no Brasil após o término do contrato com o programa Mais Médicos.


Morador de um hotel ao lado do posto de saúde de Pingo D’Água, o médico Luis Enrique Cintra González,47, já se sente “meio mineiro”. Enturmado com os funcionários do posto de saúde, ele preferiu comemorar mais um ano de vida, na quarta-feira passada, 6, com um churrasco, em vez do tradicional bolo de aniversário. “A comida mineira é a melhor do Brasil para mim. O churrasco de vocês é sem igual, isso que eu queria. Tenho descoberto várias coisas, quem sabe não arrumo até uma namorada para ficar no Brasil?”, brinca o médico, que é separado e deixou a filha de 13 anos em Cuba.

Hóspede em um hotel em Antônio Dias, a médica Alina Antônia Ortega, 48, aproveita o horário fora do expediente para andar de bicicleta e praticar a conversação do português, mas principalmente para conhecer as cachoeiras de Antônio Dias. “Até agora conheci apenas duas que ficam pertinho da cidade. Elas são praticamente um remédio de tão relaxantes. É apaixonante. Só o que achei estranho foi o feijão (tropeiro) de vocês, cheio de coisas que nunca vi”, diz a cubana.

Mais recatado, o médico Leonardo Ladea Ernandes, 43, chega à pensão da dona Conceição pouco depois das 17h, após o expediente no posto de saúde da comunidade de Lagoa do Pau, em Jaguaraçu. Instalado em um quarto com apenas uma cama de solteiro e uma cômoda simples, o médico estuda diariamente a língua portuguesa e aproveita o tempo livre para falar com a família, por meio da internet ou por um telefone celular. Apesar de a prefeitura da cidade prometer uma casa para o médico morar em um mês, ele cogita não se mudar da pensão.

“Aqui não me sinto tão sozinho e tem sempre pessoas dispostas a me ajudar. A verdade é que as pessoas dessa pensão viraram minha família”, disse.

Médico brasileiro cobra um plano de carreira

Se por um lado a rotatividade de médicos na atenção básica de saúde prejudica o atendimento de pessoas carentes, por outro, a classe brasileira justifica o vaivém de médicos pela ausência de um plano de carreira. O médico Márcio Barros, 42, se considera uma exceção entre os brasileiros por ter aceitado participar do programa Mais Médicos. Natural de Timóteo, no Vale do Aço, ele aceitou retornar para a cidade natal há um mês, após trabalhar por mais de cinco anos no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII.


Mesmo com um salário de R$ 10 mil pagos pelo governo federal, ele não considera o programa vantajoso para os colegas brasileiros. “Vim sobretudo porque quero ficar perto da minha família. Hoje em dia não quero mais dar plantões e precisar andar de um hospital a outro. Mas a proposta do governo federal é apenas um contrato que acaba em três anos e não te dá garantia nenhuma na carreira”, frisou.

Por outro ângulo, o secretário de Saúde de Jaguaraçu, Daysom de Souza Bitarães, observa que a maioria dos médicos opta por trabalhar em regime de 20h semanais, em vez das 40h por semana. “Os médicos querem trabalhar em outros lugares para ter uma renda maior. O problema é que no modelo de 20h semanais, que eles preferem, dois médicos saem 40% mais caro do que pagar apenas um que daria conta do serviço em 40h”, disse.

 

Fonte: O Tempo