Perfil de protestos já mudou
Em junho de 2013, a sociedade civil, de maneira apartidária e espontânea, foi às ruas antes e durante a Copa da Confederações para reivindicar melhorias na prestação do serviço público. Neste ano, as movimentações já começaram antes da Copa do Mundo. No entanto, o perfil do manifestante mudou. Os primeiros a buscarem as ruas foram os sindicatos de servidores públicos, o que deu caráter mais institucional aos levantes. Em Belo Horizonte, Recife, Salvador Rio de Janeiro, São Paulo e São Luís aconteceram protestos embalados por greves durante o mês de maio.
Na tentativa de entender o que está acontecendo, cientistas políticos observam as movimentações e geram um debate sobre os porquês que levaram os sindicatos às ruas. Apesar das diferentes opiniões, os especialistas concordam que 2014, ano de Copa do Mundo e de eleição, é o momento mais oportuno.
“Junho de 2013 tirou os movimentos sindicais e as instituições da inércia”, é o que acredita o cientista político Rudá Ricci. “Os sindicatos estavam enferrujados, mas, depois do ano passado, eles viram que a rua voltou a se tornar a principal arena de reivindicação e de legitimação de lideranças. Os líderes sindicais serão pressionados a não serem apenas negociadores e a pensarem em carreira política. A crise de representatividade é de todas as instituições”, afirmou.
Para o cientista político Gilberto Damasceno, os levantes de junho de 2013 não têm relação direta com as greve e os protestos dos sindicatos. O estudioso frisa que a pauta de reivindicações das entidades é mais específica. “É o melhor momento para a sociedade civil e para os sindicatos se posicionarem, mas os servidores têm foco na condição de trabalho e na campanha salarial. Já a sociedade civil busca questões mais globais”, analisou.
Damasceno não acredita que os dois possam estar juntos nas ruas durante a Copa do Mundo. “Você faz greve agora para não precisar fazer depois. As manifestações da sociedade civil serão mais fortes durante o evento porque a proposta é mostrar insatisfação com o que foi gasto para fazer a Copa”, finalizou.
Na visão do cientista político e sociólogo Moisés Augusto Gonçalves, a busca dos sindicatos pelas ruas é um indicativo da importância que a praça pública voltou a ter no mundo e um novo ciclo de participação popular. “Os protestos que aconteceram e estão acontecendo em todo o planeta remontam a rua como espaço de reivindicação, o que coincide com o surgimento de outros atores sociais que anseiam por mudanças. Os sindicalizados também estão inseridos neste contexto. Além disso, eles estão dentro da máquina administrativa e sabem o que deve ser mudado nas repartições”, observou.
Histórico pelo mundo
2010. Greves também aconteceram na África do Sul pouco antes de a Copa começar. As paralisações ocorreram no transporte público e nos portos, por meio dos estivadores, o que interrompeu a exportação de commodities e carros para Europa e Ásia.
2012. Em Londres, antes de começar as Olimpíadas, o sindicato dos rodoviários comunicou ao governo a possibilidade de greve. Antes da suspensão dos serviços, os empregados conseguiram direito a um bônus de £ 577 pelos dias trabalhados durante as competições.
Você é pré-candidato ao governo de Minas pelo PSOL, mas também foi para as ruas por meio do Comitê de Atingidos pela Copa em Belo Horizonte, ou seja, conhece o perfil dos protestos. Como analisa a participação dos sindicatos nas ruas neste ano?
Eu acho muito importante essas mobilizações. Precisamos lembrar que o funcionalismo público está sendo deixado de lado. O prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), tirou R$ 500 milhões da educação para colocar na Copa, e os Estados e prefeituras estão comemorando as Fan Fests da Fifa, que vão consumir milhões dos cofres públicos. Isso não vai trazer retorno para a população, nem vai melhorar os salários e a condição dos servidores. Acho justo que eles vão para as ruas.
Com a participação dos sindicatos, a sociedade civil terá um ganho de força na hora de protestar?
A luta dos servidores reforça a luta de todos. Eles acrescentam porque têm uma pauta definida e conhecem de dentro os problemas da saúde, da educação e da segurança. Isso qualifica cada vez mais nossa luta. Se todos ficarem juntos, teremos muitos frutos positivos para colher.
Nos últimos anos, os sindicatos não tiveram participação maciça nas ruas. A que se deve essa volta?
Eu acho que o movimento sindical tem ciclos. Existem os momentos de baixa e os momentos de alta. As condições de hoje são boas para uma retomada dos sindicatos. É ano da Copa do Mundo e de eleição. Os servidores públicos perceberam que, se tem dinheiro para gastar com futebol, tem também para melhorar os serviços públicos.
Fonte: O Tempo