Matéria publicada, hoje (14/10), no jornal O Tempo, mostra a visão técnica de especialista sobre os impactos nefastos da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 na prestação de serviços públicos, e o desmonte das categorias profissionais.
PEC 241 – Perdas de R$ 60 bi na educação
Este é o valor que o setor deixaria de receber se a regra estabelecida na proposta fosse aplicada desde 2003
Publicado no jornal O Tempo, por Bernardo Miranda, em 14/10/2016
Se a regra estabelecida pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 estivesse em vigor em 2003, quando o Brasil também enfrentava uma crise fiscal, o investimento da União em educação hoje teria R$ 60 bilhões a menos, o que representa 60% de tudo que é investido na área pelo país. Na saúde, o corte seria de R$ 51 bilhões, ou 43% do Orçamento do setor. Se trouxermos para a realidade dos investimentos estaduais, a redução dos recursos nas duas áreas também seria enorme. O governo de Minas, que em 2003 enfrentava uma das maiores crises de sua história, teria hoje menos R$ 5,1 bilhões na saúde e R$ 1,9 bilhão na educação. Esses valores representam, respectivamente, 51% e 20% do total de despesas das duas secretarias.
Educadores e médicos afirmam que, mesmo com a expansão de gastos nesse período, ainda temos uma defasagem na qualidade e na oferta dos serviços. Eles alertam que congelar as despesas por 20 anos pode não só estagnar os avanços, como provocar uma retração do estágio atual. Já economistas divergem.
A PEC 241 aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados, na última segunda-feira, prevê que o crescimento de gastos de todos os poderes e órgãos da União seja limitado ao índice da inflação oficial do ano anterior.
A regra vale por 20 anos, mesmo que a economia e a arrecadação do governo voltem a crescer. Se aprovada, ela só poderá ser modificada após o tempo mínimo de dez anos em vigor, período em que a população brasileira terá crescido 5%, segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O diretor-presidente do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais, Fernando Mendonça, explica que seria impensável a atuação da saúde hoje com um orçamento 60% menor. Ele afirma que o setor tem características orçamentárias que não permitem esse tipo de rigidez.
“Ninguém é contra que se faça um controle dos gastos. Que se crie um equilíbrio entre o que se arrecada e o que se investe. Mas essa regra não pode ser aplicada na saúde. Imagina se aparece uma nova doença, como foi o zika vírus, mas não se pode investir mais do que o previsto. Ou, então, se é descoberto um tratamento inovador contra o câncer, mas o Brasil não poderá utilizar, porque durante 20 anos os recursos na saúde estarão congelados”, destacou Mendonça.
Na educação, o congelamento dos gastos pode inviabilizar o cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação. A primeira delas que será afetada é o investimento de 10% do PIB no setor. Na verdade, em vez de aumentar esse percentual, a maior probabilidade é que a PEC 241 provoque uma redução. Isso porque a tendência é o PIB retomar o crescimento enquanto os gastos na educação permanecerão congelados.
O professor do Departamento de Ciências Aplicadas à Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Luciano Mendes afirma que as metas do Plano Nacional de Educação estão não só comprometidas pela PEC 241, mas ela praticamente impede que essas metas sejam alcançadas. Ele destaca que, além da necessidade de expansão do acesso à educação, também precisamos melhorar a qualidade do ensino, e isso se faz com a valorização dos professores. “Com essa limitação, como vamos incentivar a valorização da carreira do professor? Não adianta falar em melhoria da educação, se não pensar nas melhorias das condições de trabalho e na qualificação dos professores. E essa limitação afeta diretamente essa possibilidade, uma vez que vai impactar Estados e municípios”, finalizou.
Já para o professor de Economia do Ibmec Felipe Leroy, a saúde e a educação não podem ficar de fora da PEC 241. “É necessário manter a regra para todos os órgãos. O ajuste fiscal é necessário, hoje, porque o país chegou a uma situação em que não há possibilidade de aumento de impostos. Aumentar a carga tributária provocará redução do consumo das famílias e da atividade econômica.”
Investimento
Metas. O Plano Nacional da Educação prevê uma série de metas. Uma delas é elevar o percentual de investimento na área para 10% do PIB. Outra é elevar para 85% o percentual de jovens cursando o ensino médio até 2020.
Projeção
UFMG teria menos R$ 774,8 mi
Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que simula quais seriam os impactos que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 causaria na instituição, caso ela fosse implantada no Brasil há dez anos, mostra que a universidade teria perdido R$ 774,8 milhões.
Para o reitor da UFMG, Jaime Arturo Ramírez, essa perda que aparece no levantamento, conduzido pela Pró-reitoria de Planejamento e Desenvolvimento (Proplan) e divulgado na quarta-feira (12), equivale a cerca de quatro vezes as despesas realizadas em 2015, quando chegou a R$ 192,5 milhões.
Ainda de acordo com Ramírez, essa simulação reforça o caráter negativo do impacto da PEC 241. “Ao estabelecer que, qualquer que seja o crescimento da economia e das receitas fiscais, as despesas primárias ficarão limitadas à correção pela inflação, a proposta compromete a possibilidade de crescimento dos gastos em todas as áreas, em especial as áreas sociais”, analisa o reitor Jaime Arturo Ramírez.
“No primeiro ano da série, em 2006, não haveria perdas, mas já em 2007 a universidade teria sido impedida de realizar gastos em custeio e investimentos no valor de R$ 19,8 milhões. Essa diferença cresceria nos anos seguintes, chegando a R$ 159,8 milhões, em 2013, e a R$ 90,6 milhões, em 2015”, explica o pró-reitor de Planejamento e Desenvolvimento, Hugo Cerqueira.
A proposta precisa ser apreciada em segunda votação antes de ir ao Senado.
Ocupação
Repúdio. Um grupo de universitários ocupou ontem a Faculdade de Educação da UFMG em repúdio à PEC 241 e contra a medida provisória que trata da reforma do ensino médio.
Fonte: O Tempo