Razão dos conflitos: Veja o que pensa um policial militar novato sobre os policiais civis

Razão dos conflitos: Veja o que pensa um policial militar novato sobre os policiais civis

 

Semana passada, como os senhores sabem, policiais civis do DEOESP agrediram, tomaram a arma e algemaram um tenente, comando tático do 39º BPM, nosso vizinho aqui no 18º. Eu não estive lá. O que fiquei sabendo acompanhei pelo rádio e depois ouvi colegas. Muitos colegas.

Vou repetir: um tenente, fardado, armado, de serviço… um tenente… o comando tático… repeti isso um milhão de vezes na minha cabeça… preso por policiais civis…

Sobre a polícia civil, não serei tão repetitivo: fora o governador do estado e o secretário de defesa social, todos conhecem. Todo mundo já precisou emplacar um carro. Todo mundo já levou alguém preso e o viu livre no dia seguinte com R$20 mil a menos na conta da boca… é aquela mesma. A que grampeou o goleiro Bruno pra vender as imagens pra Imprensa. E o Deoesp é aquele lugar de onde o Fernandinho Beira-Mar saiu de taxi. Como já disse, fora o governador, todos conhecem.

Quando fiz concurso pra PM também fiz pra PC. Fui aprovado em ambos e optei por ficar por aqui mesmo. Muita gente do meu CTSP disse pra eu ir. Não fui. Pensei que nossos então 229 anos de história deveriam ser levados em conta. Pensei que nossa condição de militar nos torna um pouco melhores que o resto do mundo porque exaltamos valores como a lealdade e a coragem. Pensei que nossa formação de mais de ano deveria ser melhor que os cinco meses da Acadepol. Talvez eu tenha feito a escolha errada.

Sou praça novo. Entrei na polícia ontem. 2004. Mas aprendi rápido como as coisas funcionam. Aprendi mas não queria acreditar. Agora acredito. Acredito que nós, praças e oficiais subalternos somos pintinhos de chocadeira, sem mãe, abandonados a própria sorte. Ninguém, absolutamente ninguém está por nós. Promotores e juízes jamais entenderão as peculiaridades de nosso trabalho. Policiais Civis continuarão se recusando a se identificar, mesmo portando suas carteiras de prática livre de extorsões. Oficiais superiores? Bem, eles já não são mais como antigamente. O orgulho e o compromisso de lealdade com os subordinados quase sempre é trocado por um gabinete com uma Pfen bonita na recepção, promoções rápidas e pela boa relação dentro da Secretaria de Defesa Social. Cada um de nós, quando muito, só pode contar com a própria equipe de radiopatrulhamento. Por isso as guardas de quartéis, SOU, intendência estão cheias de policias bons de serviço. Caçadores de bandidos que querem aposentar suas espingardas e esperam ansiosamente inteirar o 30º ano de serviço.

Enquanto os nossos colegas civis cometem todos os tipos possíveis de falcatruas, nossa patrulha de correção saí a caça de militares com coletes compartimentados e coldres de nylon. Pegamos o traficante de dia e levamos para o delegado engordar a caixinha de sua equipe. De noite nos escondemos da corregedoria e da fiscalização no bico…

Não conheço o Tenente que foi preso. Nunca o vi. Mas sinto como se o preso tivesse sido eu. Sua prisão foi um tapa, uma escarrada na cara de todos nós. Uma demonstração de que um pincher, isso mesmo, um pincher, uma instituição sem prestígio e sem preparo de menos de 10 mil homens no estado pode morder um pastor alemão de quase 50 mil e quase 2 séculos e meio de história. Um PM algemado no meio da rua… eu jamais imaginaria algo semelhante. Na verdade, ainda não imagino.

Me lembro de um dos meus primeiros comandantes de viatura: Mauro Lúcio do Nascimento: Cb PM 70.900-6. Tinha todas as suas fardas guardadas no armário, desde os tempos de recrutamento. Todos os tipos, até quepe bico de pato. Na estante um monte de miniatura de viaturas. Comprava os carrinhos brancos, imprimia a logomarca e as cores da PM e montavas suas viaturas… ele deve ter juntado tudo no quintal e feito uma grande fogueira…

   Orgulho. Tem jeito não… preciso esquecer o que me ensinaram nas terras do 36º BPM. Fazer o que andam fazendo por aí: deixar de ser POLICIAL MILITAR para ser funcionário público.