Ministério das Cidades quer implantar até o fim do ano exame nacional para testar desempenho de instrutores de centros de formação de motoristas e examinadores. Objetivo é melhorar a qualidade de profissionais e, assim, dos condutores nas ruas.
Um dia é do candidato, outro do examinador. Se depender da intenção do governo federal, os responsáveis por avaliar os futuros motoristas também vão enfrentar a sensação de ter seu desempenho testado. Na tentativa de melhorar a qualidade dos motoristas brasileiros e monitorar o desempenho de instrutores de autoescolas e examinadores dos Detrans, o ministro das Cidades, Aguinaldo Ribeiro, promete instituir até o fim do ano um provão, com a aprovação como requisito para o exercício das funções. Porém, em estados como Minas Gerais, onde o número desses profissionais é elevado, o ministério enfrenta dificuldade para viabilizar uma prova eletrônica para cerca de 15 mil instrutores e 800 examinadores. A coordenadora de Educação de Trânsito do Detran/MG, Maria Cecília Lopes de Abreu, acha que não vai dar tempo, mas, para monitorar o trabalho e requalificar os profissionais – pelo menos os envolvidos na orientação dos candidatos –, decidiu implantar um curso voltado para diretores e instrutores dos centros de formação de condutores (CFCs) que não estão garantindo aprovação mínima de 60% nas provas teóricas do departamento.
Em nota, o Ministério das Cidades informou que o projeto do Exame Nacional de Instrutores e Examinadores de Trânsito (Enit/Enet) está em fase final de elaboração e deve ser implementado antes de 2014. O provão será obrigatório para todos os instrutores e examinadores do país, que farão um curso a distância de 60 horas antes da avaliação. Para ser aprovado, o candidato precisa ter aproveitamento de 70%. Do contrário, explicou o ministério, ele terá que passar por uma requalificação no Detran de seu estado.
Em Minas, o projeto piloto do curso voltado apenas para instrutores teve 160 alunos. Nas novas turmas, a partir do dia 29, haverá 1.040 instrutores e diretores. Segundo a coordenadora de Educação de Trânsito do Detran, Maria Cecília Abreu, eles trabalham em autoescolas de todo o estado e deverão assistir a 60 horas de aulas para uma avaliação de conteúdo no fim do período. “É um modo de obrigá-los a fazer o curso. E ainda têm que tirar nota mínima de 70% para passar”, afirma a coordenadora, dizendo que Minas é o único estado que faz esse tipo de curso. “Se não temos um bom instrutor, não teremos um bom aluno.” Porém, o Detran informa que ainda não sabe qual será o tratamento dado aos profissionais que não tiverem o aproveitamento mínimo.
Maria Cecília esteve em Brasília no fim de agosto, quando soube da ideia do ministro de fazer valer uma resolução de 2008 para testar examinadores e instrutores. “A proposta é antiga, mas viabilizar esse processo é que é complicado”, diz. Atualmente, os instrutores precisam fazer uma reciclagem a cada cinco anos, em entidades autorizadas pelo Detran. Questionada sobre a qualidade dos CFCs, a coordenadora de Educação de Trânsito admite que deixa a desejar. “A gente vê que tem muito o que melhorar. Ao mudar o nome de autoescola para centro de formação, eles ganharam um papel de educar o condutor. É por isso que o Detran/MG está arcando com o custo desse curso, na tentativa de melhorar os CFCs.”
CONTRA AVENTUREIROS Advogado especializado em trânsito, Tales Lucena vê uma íntima relação entre a má formação de instrutores e o alto índice de reprovação nos exames práticos, que em Minas chega a 67%, um dos maiores do país. Ele acredita que é importante haver um acompanhamento desses profissionais ao longo da carreira, por parte do governo e dos departamentos de trânsito. “Se você não se atualiza, em qualquer profissão, a qualidade do seu trabalho tende a cair”, avalia. “Tenho medo mesmo é daquele aventureiro, que está ali até arrumar alguma coisa melhor. Esse faz por obrigação e não com didática para ensinar a dirigir. O provão exige esforço e vai espantar aquele que não está disposto a ser um instrutor.”
O estudante de engenharia química José Geraldo Esteves Guedes Junior, de 20 anos, tirou carteira no ano passado, depois de “passar aperto” com seu instrutor. “Eu ia dirigindo para ele buscar o filho na escola. Mas o pior, logo nas primeiras aulas, foi o dia em que ele dormiu. Eu perguntei para onde tinha de ir e ele não respondeu. Quando olhei para o lado, ele estava cochilando”, conta José Geraldo. “Foi um perigo, já que eu não sabia dirigir direito.” O jovem fez a prova prática, mas não passou e decidiu mudar de autoescola. Ele achava que o primeiro instrutor era relapso e cobrava pouco.
No último sábado, foi a vez de a estudante Carolina Ribeiro, de 19 anos, tentar a carteira pela segunda vez. As divergências com o instrutor eram frequentes e, pouco antes da prova, eles discutiram novamente. “Ele era impaciente, cobrava muito e dizia que eu tinha que aprender a dirigir para passar no exame. Quando eu fazia alguma coisa errada, ele pisava no freio e reclamava comigo.” Carolina conta que certa vez saiu do carro aos prantos, depois de uma bronca quando errou o controle de embreagem.
Situações como essa, segundo presidente do Sindicato dos Proprietários de Centros de Formação de Condutores do Estado de Minas Gerais, Rodrigo Fabiano da Silva, são comuns. Há quem reclame também dos examinadores. “Tem examinador que é grosseiro, mas o candidato já está tão fragilizado com aquela pressão que qualquer palavra vira uma tempestade em copo d’água”, atenua. “O monitoramento do exame com câmeras vai jogar luz sobre esse problema e deve reduzi-lo.” Para Rodrigo, apesar de não interferir na questão das relações pessoais, o provão é uma boa medida, se as empresas puderem ter acesso às notas e houver um ranking por categorias. “Se for uma prova com contexto qualitativo, valoriza o profissional e a autoescola. Servirá também para afastar ou requalificar aquele que não for bem no provão, até que ele possa voltar a exercer sua atividade atualizado”, diz Rodrigo.
O Detran/MG começou a testar o uso de câmeras em exames de direção, com equipamentos de uma empresa paulista. Em setembro, 10 alunos fizeram baliza e circuito de trânsito monitorados por um sistema que grava as imagens. A ideia é dar transparência às provas e evitar situações como as negociações para compra de carteira. Segundo o presidente do Sindicato dos Proprietários de Centros de Formação de Condutores do Estado de Minas Gerais, Rodrigo Fabiano da Silva, todos os carros de autoescolas devem receber as câmeras até dezembro. O Detran-MG informou que esse foi o primeiro teste e que equipamentos de outras empresas serão avaliados. Definida a tecnologia, uma portaria deverá ser publicada para homologar o sistema, mas ainda sem previsão de prazos.