Familiares de vítimas de crimes reclamam de impunidade
"Roubaram e mataram o meu filho Matheus, de 21 anos, e sei que eles não vão pagar pelo que fizeram. Serão julgados pela idade, e não pelo crime que cometeram”. Com um depoimento que emocionou a todos, Ângela Maria da Fonseca, mãe de Matheus Salviano Botelho, assassinado em 7 de fevereiro no bairro Gutierrez, em Belo Horizonte, resumiu a sensação de impunidade que os familiares do jovem estão sentindo. Ela e outros parentes de vítimas de homicídios ocorridos em janeiro e fevereiro deste ano participaram, nesta terça-feira (18/3/14), de audiência da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para debater os crimes.
Na opinião de Ângela, a impunidade é um convite para o crime. “Os bandidos estão protegidos e nós, não”, disse. Ela ainda ressaltou que os presentes ali não sabem o que é para uma mãe passar a noite ao lado do caixão do filho.
Segundo o tio de Matheus, Benedito Sérgio de Resende, os dois menores assassinos do seu sobrinho estavam prestes a completar 18 anos, mas vão cumprir medidas socioeducativas e, no máximo, três anos de reclusão. “A população não aceita mais uma legislação como essa, que protege assassinos”, disse. Benedito destacou a competência da polícia, que descobriu e prendeu os autores do crime. Por outro lado, sua sensação é de desânimo, já que a polícia prende os criminosos e depois eles são soltos.
O trabalho da polícia também foi destacado por Erlane Viggiano Costa, irmã de Lívia Viggiano Rocha Silveira, assassinada no dia 3 de janeiro na Serra do Cipó, junto com o namorado e servidor da ALMG, Alexandre Werneck de Oliveira.
Também emocionada, Erlane afirmou não esperar nada dos criminosos que mataram sua irmã e Alexandre. Espera apenas a Justiça, e vai cobrar isso dos governantes e parlamentares. Ela defendeu a necessidade de mudança na legislação penal. “Dói muito. Não tem um dia em que não penso na Lívia e no Alexandre. Será que (a criminalidade) precisa atingir um por um dos senadores para mudar? Eu não quero isso para eles”, ponderou Erlane. “Vamos mudar isso, por favor, por todos nós”, completou.
A sensação de desamparo, impunidade e indignação também deu o tom da fala do gerente do Procon Assembleia, Gilberto Dias, amigo de Alexandre há 24 anos. Ele ressaltou que a população quer o endurecimento da legislação penal. O coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa, também lembrou os anos de amizade ao lado de Alexandre.
90% dos homicídios na RMBH são com armas de fogo
O chefe do Departamento de Investigação de Homicídios da Polícia Civil, Wagner Pinto, destacou que em Belo Horizonte, Contagem, Betim, Ibirité, Ribeirão das Neves, Santa Luzia, Vespasiano e Sabará foram registrados, em janeiro e fevereiro deste ano, 295 homicídios. Desses, 90% foram com armas de fogo, e 90% dos autores são do sexo masculino, de baixa renda e escolaridade e com idade inferior a 30 anos. Informou, ainda, que a causa principal dos crimes está relacionada ao tráfico de drogas, e os assassinatos geralmente acontecem aos finais de semana e nos aglomerados.
“O diagnóstico do crime de homicídios está aí. Trabalhamos com dedicação e com escassez de recursos humanos para tentar levar resultados para a sociedade e minimizar os conflitos”, disse Wagner Pinto.
No caso do assassinato de Matheus Botelho, o chefe do Departamento de Homicídios lembrou que os dois autores do crime eram menores e vão ficar acautelados por pouco tempo. Em sua opinião, o sistema de segurança pública precisa mudar, e o Legislativo precisa produzir uma legislação mais firme e contundente. “A sociedade brasileira necessita urgentemente de uma resposta imediata do Congresso”, defendeu.
Questionado pelo presidente da Comissão de Segurança Pública, deputado João Leite (PSDB), sobre a origem dessas armas, Wagner Pinto disse que os marginais adquirem-nas de forma tranquila, já que existe um tráfico internacional de armas. “A polícia nunca apreendeu tantas armas de fogo como agora”, afirmou.
Já o capitão PM Harley Wallace Moreira destacou que melhorar recursos humanos e logísticos não é a solução isolada do problema, pois é preciso mudar também as estratégias de atuação da polícia. Ele ponderou que se houve crime, houve falha do Estado, mas que a polícia está trabalhando para combater a violência.
Deputados cobram mudanças na legislação penal
Para o autor do requerimento que motivou a audiência, deputado Sargento Rodrigues (PDT), o objetivo é ouvir os familiares de pessoas que “foram vítimas da crueldade e da covardia de bandidos, que causaram uma dor irreparável”. Ele se questionou se os governantes não estão enxergando a dor das pessoas e cobrou a responsabilidade que cabe aos governos Federal e Estadual, às policias e à Comissão de Segurança Pública nesta luta contra o crime.
O parlamentar lamentou, ainda, o fato de ninguém temer a punição diante da atual legislação penal brasileira. “Quem vai temer a punição? O adolescente que participou do latrocínio da morte do jovem Matheus?”, questionou. Ele lembrou que a pena máxima no Brasil é de 30 anos, mas depois de cumprir um terço da pena, os criminosos progridem para o regime semi-aberto. “Os assassinos do promotor Francisco José Lins do Rego e da menina Miriam Brandão já estão nas ruas”, disse. “Até quando as pessoas precisam morrer na mão dos bandidos para endurecermos a legislação penal?”, perguntou.
Já o deputado João Leite disse que a presença dos familiares das vítimas na audiência é uma grande contribuição para a Comissão de Segurança Pública. Ele destacou que a comissão está buscando entender o fenômeno dos homicídios com arma de fogo a despeito do desarmamento da população. E informou que irá apresentar requerimento para que a comissão vá a Brasília com familiares das vítimas para cobrar ações mais efetivas no combate à criminalidade.
Amigo da família de Matheus, o deputado Antônio Carlos Arantes (PSDB) citou vários casos de violência no interior do Estado e afirmou que a sociedade cansou de ser vítima desses crimes. Disse, ainda, que o poder público precisa reagir, incluindo prefeitos, vereadores, deputados e governadores.
Já o deputado Cabo Júlio (PMDB) afirmou que a redução da maioridade penal não passou no Congresso porque houve um movimento defendendo a manutenção da maioridade aos 18 anos. Ele ressaltou a sensação de medo que a população está vivendo e disse que é preciso uma reação do poder público. Na sua opinião, em breve a sociedade vai virar um "faroeste".
Audiência pública – Foi aprovado requerimento do deputado Sargento Rodrigues para discutir as violentas ações que têm ocorrido em Itajubá (Sul de Minas), em especial os ataques a residências de agentes penitenciários. Segundo o parlamentar, o último ataque ocorreu na última quarta-feira (12), e foi o sétimo apenas neste mês.
Fonte: ALMG