Família de ladrão de galinha nem sabe o que é o Supremo, Defensora pública diz que nunca imaginou que caso fosse parar nas mãos do ministro Luiz Fux.

Família de ladrão de galinha nem sabe o que é o Supremo,  Defensora pública diz que nunca imaginou que caso fosse parar nas mãos do ministro Luiz Fux.

A mãe de Afanásio Maximiano Guimarães nem sabe do que se trata o Supremo Tribunal Federal (STF), tampouco quem é e o que faz o ministro Luiz Fux. Mas é lá que tramita o processo judicial a que seu filho responde: o furto de um galo e uma galinha avaliados em R$ 40, no distrito de Rochedo de Minas, na Zona da Mata.

Na madrugada de 10 de maio de 2013, Afanásio, 27, retirou os animais do quintal do vizinho Raimundo das Graças Miranda, primo distante da sua família, e sumiu. A vítima prestou queixa à polícia. “Depois de intimado, ele veio pedir desculpas e assumir o ato, mas já era tarde. Não quero dinheiro, só espero que o processo lhe sirva de lição. Afinal, ‘quem tira prego tira carro’”, disse Raimundo.

Afanásio não foi encontrado nessa quarta para comentar o caso. Segundo a família, ele está recluso na casa de uma tia em Juiz de Fora para tratamento em uma clínica psiquiátrica. A reportagem de O TEMPO ouviu alguns moradores do município que o descrevem como alguém “meio aluado, um pouco estranho e de olhar esquisito”. Um dos irmãos do acusado, Alessandro, o descreve como bipolar. Já o cabo da Polícia Militar do município, Joaquim da Silva, acredita tratar-se de esquizofrenia. “Mas nunca me mostraram um laudo”.

A mãe de Afanásio, Maria de Aparecida Maximiano Guimarães, diz que ele nunca gostou nem se interessou por nada, ficava sempre quieto e cabisbaixo dentro de casa e não conversava muito.

Processo. A defensora pública Renata Cunha Martins, de São João Nepomuceno, também na Zona da Mata, é responsável pelo processo e diz que nunca imaginou que esse tipo de caso fosse parar no Supremo. Ela recorreu à Justiça da cidade para arquivar o processo alegando “princípio da insignificância”, que leva em conta o produto do furto.

Quando o recurso foi negado, o processo chegou em Belo Horizonte. Um outro defensor tentou o mesmo que Renata no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, e também não conseguiu o arquivamento. Por isso, ele recorreu ao Supremo.

No último dia 2, o ministro Luiz Fux negou o pedido de liminar para que a ação fosse suspensa. Ele decidiu pedir um parecer do Ministério Público Federal. Em seguida, o caso deverá ser julgado pelos ministros da 1ª Turma do STF.

Renata informou que está prevista uma audiência para o dia 6 de maio, na qual o juiz deverá oferecer condições ao réu para que o caso seja encerrado, como não se ausentar da cidade durante mais de uma semana sem autorização judicial.

Prisão

Histórico. Afanásio Maximiano Guimarães não chegou a ser preso pelo furto. Segundo a Polícia Militar, ele já tem outras passagens com detenção, inclusive por depredação de uma viatura.


Saiba mais

Animais. 0Raimundo das Graças Miranda informou que não recebeu o galo e a galinha de volta. Uma das irmãs de Afanásio brincou dizendo que “viraram canja”.

Posição. A Defensoria Pública de Belo Horizonte foi procurada e informou que como o processo está no Supremo, não tem como dar mais informações sobre o não-deferimento do recurso.

Especialista questiona decisão do STF pelo não-arquivamento

O presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil seção Minas (OAB/MG), Bruno Burgarelli, acredita que levar esse tipo de caso ao Supremo Tribunal Federal (STF) representa um atraso para o Judiciário brasileiro.


“Essa discussão demonstra uma falha do sistema judicial e, de acordo com a coincidência de fatos como o furto de animal por um possível deficiente mental, a questão se torna muito rasa para que seja discutida pelo Supremo. Isso traz descrença ao direito”, diz.

Ele ainda questionou a posição do Supremo, que negou o pedido para que a ação fosse suspensa. “Crimes mais sérios não estão tendo as devidas apuração e punição. Deveria haver mais bom senso do STF”, avaliou Burgarelli.

Perfil

Sempre quieto, acusado não ‘tinha interesse por nada’

Maria de Aparecida Maximiano Guimarães, mãe de Afanásio, não tem instrução, não trabalha nem sabe ao certo a idade que tem. Ela estranhou a presença da imprensa na cidade, em busca de informações sobre o seu filho. “Que povo todo é esse perguntando da vida da minha família? Tudo por causa de uma galinha? Não estou entendendo nada”.
 

Mãe de sete filhos e avó de uma garota de 2 anos, ela nasceu na zona rural e se mudou há alguns anos para Rochedo de Minas. A casa de três pequenos quartos, com sala, cozinha e banheiro igualmente apertados, foi construída “no jeito que deu”, nos fundos de outro terreno. No espaço improvisado, moram a neta e três filhos. Os outros foram buscar trabalho em cidades no entorno e, como ela, têm pouca ou nenhuma instrução.

Maria de Aparecida disse que Afanásio nunca gostou nem se interessou por nada, ficava sempre quieto e cabisbaixo dentro de casa e não conversava muito. “Às vezes, ele explodia de raiva e brigava com todo mundo”, relata a irmã Arla. Alguns moradores contaram ter medo do rapaz, como uma vendedora que pediu para não ter o nome revelado. “Ele saiu nas ruas com um facão imenso. Falam que ele matou um cachorro para beber o sangue”, disse. Familiares confirmaram a morte do animal, mas disseram desconhecer a história do sangue.

Fonte:  O Tempo