O equívoco da integração
Sempre que o grau de insegurança numa comunidade se altera, principalmente quando o número de crimes violentos atinge elevados patamares, tem sido comum colocar um bode na sala: imputa-se a culpa na falta de integração das polícias Civil e Militar. É uma manobra diversionista, um desvio de atenção do fundamental questionamento relativo às causas de aumento nas estatísticas criminais. Quais as verdadeiras origens disso? Principalmente, os menores em situação de risco e o sistema de administração penal (penitenciário?).
A estratégia da integração teve relativo sucesso, após seu lançamento, em razão da novidade e do fortíssimo marketing. A intenção era reduzir perdas, na área da salvaguarda social, sub-área de combate à criminalidade, provocadas por eventuais desajustes entre as duas polícias mais atuantes na contenção da ameaça de crime. Conflitos pontuais, natural defesa do espaço institucional, pressupostamente invadidos. Nada que a autoridade superior, o governador, não possa solucionar de plano. Quando em jogo o interesse público, esses órgãos interagiram e deram respostas imediatas e positivas. A interação, a harmonização de esforços no cotidiano sempre ficaram a desejar, por falta de diretriz governamental explícita. Faltou coragem ou desconhecimento para uma ordem definitiva: a Polícia Militar fica proibida de fazer investigação de autoria e materialidade de delitos, a Polícia Civil fica proibida de fazer a polícia ostensiva.
Assessores confundiram interação com integração, unificação utópica das duas polícias. No novo governo, tentam emplacar a lorota maquilada. Profissionais competentes (além do conhecimento, têm capacidade para operacionalizá-los) louvam a interação e abominam a integração. Que não vai descer goela abaixo!…
Recentemente, ocupantes de altos cargos na Secretaria de Defesa Social, altamente qualificados, foram defenestrados porque a tal integração está dando água. No frigir dos ovos, falta autoridade, que não deve ser a Seds, que, aliás, nem deveria existir, pois, na prática, tenta coordenar, tão somente, uma parte da salvaguarda social, uma área da defesa social, sem sucesso. O vice-governador, que preside (?) o Conselho Estadual de Defesa Social (órgão consultivo do governador para a definição da política de defesa social do Estado), poderia ser essa autoridade. Mas é um órgão inerte, que não quer ser pai da criança, o que nos remete aos tempos coloniais de "queixar ao bispo".
A insegurança relativa à criminalidade estará em níveis toleráveis quando questões relativas aos menores em situação de risco e ao sistema de administração penal forem, minimamente, mitigadas; a interação for estimulada; os recursos humanos, administrativos e logísticos das polícias receberem mais atenção; a expertise de profissionais tiver mais valor do que "insights" de teóricos; o Conselho for, efetivamente, instalado e, por fim, quando houver autoridade na coordenação da defesa social. Errar é humano, persistir no erro…
Publicado no Jornal O Tempo em 29 de fevereiro de 2012